Nunca vou me esquecer de um dos dias mais felizes da minha vida: o dia que eu tinha em mãos um exame de gravidez positivo.
Meu marido e eu tínhamos planejado a viagem dos sonhos. Eram nossas férias e após esse descanso, seria hora de começar a tentar a gravidez de nosso primeiro filho. Ninguém sabia como iria ser, a ideia seria deixar rolar, sem pressão, sem expectativas.
“Sem expectativas”.
Dizer “não crie expectativas” para uma tentante é o mesmo que dizer “não se apaixone”; “não se envolva” para uma pessoa que conheceu alguém interessante. A gente acha que tem o controle. Mas não tem.
Eu já tinha planejado na cabeça até o momento em que eu daria a notícia do positivo: no restaurante dos sonhos cuja reserva foi cuidadosamente feita muito tempo antes da viagem. Fiz todas as contas, daria para ser ali.
Fui na farmácia e me deparei com aquelas muitas opções testes de gravidez. Tentei fazer um filtro, escolhendo os que tivessem a maior taxa de confiabilidade, mas todos tinham um índice muito parecido: 99,9% de precisão. Peguei um que jurava que detectava a gravidez, mesmo antes do atraso menstrual. “Esse é o melhor, pensei!”
Guardei na mala e me esqueci dele, tinha a viagem para curtir. De fato, foi uma das melhores da vida! Você pode não acreditar, mas uma coisa muito estranha começou a acontecer. As pessoas começaram a me tratar com uma gentileza inédita: me ofereciam um lugar para sentar no metrô, seguravam a porta para eu passar…Uma ideia fixa e muito louca me veio: ”tem uma energia de grávida rolando, com certeza”!
Comecei a achar que estava gorda. Comendo demais, eu estava mesmo (férias, né?)! Mas eu sempre fui muito magra, muito pequena e ali, só usava casacão de frio…não tinha nada estético que pudesse confirmar que era isso. Comentei com o meu marido essa coisa da gentileza exagerada e ele achou graça. “Mulher tem cada coisa!”
Até que um dia, numa baladinha totalmente underground que a gente resolveu ir, uma adolescente meio revoltadinha passou por mim em linha reta, numa pressa doida, como se fosse me atravessar. Me deu um esbarrão que quase me jogou longe! Um segurança veio, nem sei de onde, pegou a menina pelo braço e falou: “ei, a gente não anda assim, aqui! Tenha mais cuidado e por favor, peça desculpas pra moça que você quase derrubou”.
A menina me fuzilou com o olho. As pessoas me olhando, aquela situação constrangedora, só consegui dizer: “não é necessário está tudo bem.”
Mas ele insistiu. Sabe quando o pau quebra entre irmãos e a mãe resolve dizer: “pede desculpas pro seu irmão agora! Dá um abraço nele…” A menina soltou um “desculpa” com dente meio travado, deixando muito claro que era pela força do constrangimento e eu mais sem graça ainda, aceitei, tentando fingir alguma normalidade. O lugar era meio estranho, a gente decidiu ir embora logo e diminuir a chance de alguém nos pegar na saída.
Chegando no metrô, sãos e salvos, nós rimos demais da situação. “Ok, agora, eu tô começando a achar que tem algo estranho acontecendo!”, meu marido brincou.
Os dias seguintes foram os melhores da vida, uma sensação de paz, um silêncio interno incrível, eu e o meu marido muito conectados e a viagem seguiu perfeita.
Até que chegou a hora de fazer o teste de farmácia. Escondi a caixinha na roupa, entrei caladinha no banheiro, fiz o xixi no coletor, botei a fitinha lá e esperei. Estava absolutamente tranquila. Era a primeira tentativa, peso nenhum. Se desse positivo, tudo bem. Eu era adulta, casada, financeiramente capaz, eu queria, meu marido também… já era a hora mesmo. Se desse negativo, tudo bem, a gente tenta de novo, tudo certo!
E foi o que deu: negativo. Joguei tudo no lixo, entrei no banho e…chorei. Chorei muito! Foi ali, quando o exame deu negativo que eu me dei conta do quanto queria esse filho. E como doía aquele negativo!
O “jantar da notícia” seguiu. Um lugar maravilhoso, comida ótima, mas com aquela tristeza por dentro. Quem mandou idealizar? Eu nem tinha noção de quanta expectativa tinha alimentado. Eu me sentia tão idiota, infantil, não sei explicar o que eu estava sentindo…
Os dias se passaram, voltamos para a casa. Eu continuava a me sentir estranha. Meus seios começaram a ficar estranhos, não conseguia nem usar um sutiã direito. Meu marido começou a ficar preocupado. “O teste deu negativo, não foi? Não crie expectativa de novo, foi tão difícil pra você…” Estaria eu tendo alguma reação psicológica à quebra de expectativa? O que estava acontecendo?
Passaram-se mais uns dias e o Natal estava chegando. No dia 23 de dezembro, resolvi fazer um novo teste de gravidez. Comprei um mais moderno desta vez ou pelo menos, eu achava que era. Mais uma vez, entrei caladinha no banheiro, fiz o xixi, coloquei a “caneta”, tampei e me arrependi amargamente de ter inventado isso de novo! Deu o tempo e eu pensei: quer saber, vou jogar essa porcaria fora e nunca mais vou fazer isso, é muito doloroso, quando se quer muito!” Recolhi caixa, manual…tudo e quando fui jogar a caneta no lixo, estava escrito lá: grávida 1-2 semanas.
Eu não conseguia parar de olhar para a caneta! Desabei a chorar, tentando conter minhas pernas, que tremiam muito e tentando recuperar na cabeça as mil e uma formas especiais de dar a notícia pro meu marido. Não vinha nada. Nada! Não conseguia pensar em nada.
Meu marido ouviu meu choro e foi lá, me consolar. Abri a porta, a gente se abraçou e ele começou: tudo bem, a gente vai tentar de novo…Falou, falou, falou…e eu não conseguia falar nada nem parar de chorar. Depois de muita falação e “consolo”, só entreguei a caneta pra ele – e ele desabou também! E essa foi a forma especialíssima que eu dei a notícia, a melhor da minha vida de jornalista: muda.
Guardei a caneta o tanto quanto pude. Naquela tarde, eu ia a cada 15 minutos olhar pra ela. Era tão bom olhar para aquilo! Minha vontade era de que a bateria durasse para sempre! E durou. Vai ser uma imagem que para o resto da vida vai ficar guardada na minha cabeça. Uma das melhores que meus olhos já viram!
Depois de muita emoção, um medo enorme surgiu: eu tinha um negativo e um positivo. Sabíamos que um falso positivo era muito difícil, então, o jeito era confirmar com o exame de sangue. A questão era: pelo horário, a coleta já estava encerrada, teria de ser no outro dia. Onde encontraríamos um laboratório aberto no dia 24 de dezembro?
Achamos. Chegamos cedo e encontramos funcionários parados, entediados, doidos pra dar o horário de ir embora e celebrar o Natal. Cheguei, paguei o exame e perguntei quando o resultado sairia porque a gente queria dar a notícia para a família. Aí, começou uma enorme mobilização no laboratório para o laudo sair o mais rápido possível. Liga aqui, lá, na Central…me prometeram que sairia daí a pouco. Foram as horas mais maravilhosas da vida! E o resultado saiu mesmo, com um hCG baixinho, coisa de gravidez bem no início mesmo. Mas pouco me importava, era um exame de gravidez positivo!
Esse foi o melhor Natal da vida. O dia que eu entendi que “coisas boas também acontecem”. A data nunca mais foi a mesma, virou um segundo aniversário do meu filho, um dia que eu faço muita questão que seja tão alegre quanto aquele.
Depois, veio a loucura de achar uma obstetra, de começar um pré-natal estranhíssimo, os medos, as dificuldades…casos para outras conversas. Só contei esta história para lembrar que:
- Fazer teste de gravidez bem no início pode dar falso negativo;
- O exame de sangue é sempre a melhor opção, o mais preciso;
- Planejar mil formas de contar é legal, mas viver o momento é o mais importante;
- Expectativa é algo que nos destrói, mas às vezes é muito difícil controlar;
- Ter um parceiro que queira viver isso também é fundamental para todas as dificuldades e todas as alegrias que surjam no processo;
- Energia de grávida é uma coisa real (?).